quarta-feira, 23 de março de 2011

STF começa a julgar validade da Lei da Ficha Limpa

Laryssa Borges - Direto de Brasília

stf_gervasio_baptista_ascom O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) começou a julgar por volta das 14h45 desta quarta-feira novo caso sobre a aplicação da Lei da Ficha Limpa nas eleições de 2010 e, ao longo do dia, deve dar o veredicto sobre a vigência ou não das novas regras de inelegibilidade no pleito do ano passado.

A expectativa é pela manifestação do mais recente integrante da Corte, o ministro Luiz Fux, único dos magistrados que ainda não externou uma posição pessoal clara sobre se concorda ou não com a vigência da legislação para as últimas eleições e tampouco sobre se as condições de elegibilidade podem incluir irregularidades cometidas pelos políticos no passado, antes da existência da lei.

Os magistrados julgarão o caso específico de Leonídio Bouças (PMDB-MG), que teve indeferida sua candidatura ao cargo de deputado estadual pela Justiça eleitoral por ter sido condenado anteriormente por improbidade administrativa. O político defende que seja observado o artigo 16 da Constituição Federal, que estabelece que a lei que alterar o processo eleitoral não pode se aplicada à eleição que ocorra a menos de um ano da data de sua vigência. A Lei da Ficha Limpa foi sancionada pelo então presidente Lula no dia 4 de junho de 2010, a poucos meses do primeiro turno do processo eleitoral.

No julgamento desta quinta, cada ministro deverá manifestar seu entendimento acerca do princípio da anualidade e, consequentemente, sobre a possibilidade de se aplicar a legislação nas eleições de 2010. Embora dez deles já tenham votado em casos concretos envolvendo a Ficha Limpa, podem mudar de posição na situação de Leonídio Bouças. Se mantiverem suas opiniões defendidas em julgamentos anteriores sobre políticos "fichas sujas", cinco ministros serão contra a aplicação da lei em 2010 e outros cinco defenderão a validade imediata da legislação. Caberá ao ministro Luiz Fux, indicado pela presidente Dilma Rousseff, desempatar o caso.

Entendimento de cada ministro
Os ministros Celso de Mello, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello, Dias Toffoli e o presidente da Corte, Cezar Peluso, são em tese favoráveis à aplicação da Lei da Ficha Limpa em um cenário após 2010. Em sentido contrário, são defensores de que a ampliação das condições de inelegibilidade possa ser aplicada nas eleições de 2010 e consequentemente barrar "fichas sujas" os ministros Joaquim Barbosa, Ellen Gracie, Carlos Ayres Britto, Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski. Veja os argumentos de cada um externados nos julgamentos em que o Plenário analisou os casos específicos do então deputado Jader Barbalho (PMDB-PA) e do candidato à época ao governo do Distrito Federal, Jaquim Roriz (PSC-DF).

Celso de Mello: Defende o direito à "inviolabilidade do passado" e diz que a aplicação imediata da Lei da Ficha Limpa é "uma gravíssima limitação ao direito fundamental de participação política". "Me preocupa a ação no passado de efeitos restritivos por lei superveniente, (...) atribuindo sanção a um ato já esgotado em todas suas potencialidades jurídicas. A lei não pode conferir efeitos jurídicos gravosos restritivos de um direito fundamental", disse no julgamento, em outubro de 2010, sobre a aplicabilidade da Lei da Ficha Limpa.

Gilmar Mendes: Principal articulador dos mais duros argumentos contra a aplicação imediata da lei, defende que a validade das novas regras de inelegibilidade a partir de 2010 seria um "convite para um salão de horrores". "Dificilmente vai se encontrar um caso tão explícito em tempos democráticos de mais inequívoca retroatividade, de mais escancarada, de mais escarrada retroatividade (...) para a manipulação inclusive das eleições", afirmou na época do julgamento de Jader Barbalho.

Cezar Peluso: Acredita que a Lei da Ficha Limpa tem caráter "casuístico" e é contra a aplicação das regras de inelegibilidade para casos ocorridos no passado. "Não concordo com a interpretação de aplicação retroativa da lei. Já havia antecipado o caráter absolutamente casuístico da lei. Essa é uma lei personalizada porque atinge pessoas determinadas, conhecidas antes de sua edição", disse o magistrado no julgamento de outubro de 2010.

Marco Aurélio: Acredita que a aplicação da lei em 2010 viola o artigo 16 da Constituição Federal, que estabelece que a lei que alterar o processo eleitoral não pode se aplicada à eleição que ocorra a menos de um ano da data de sua vigência. "A sociedade não pode viver em sobressaltos. Não se avança considerando o anseio popular, atropelando-se valores maiores. E os valores maiores estão na Carta da República. Não pode ser uma quadra de abandono de princípios e perda de parâmetros por aquele que tem atribuição maior de guardar a Carta da República, que é o Supremo", defendeu o ministro no julgamento de outubro de 2010.

Dias Toffoli: Defende que não é pelo fato de a Lei da Ficha Limpa ter forte apelo popular que o STF deve aceita-la de imediato, tornando-a válida para 2010. É favorável ao respeito ao artigo 16 da Constituição. "A lei claramente restringiu o universo de candidatos aptos a participar de pleito do ano passado. Em nome de princípios moralizantes deixamos de lado um artigo constitucional abstrato e impessoal que protege a própria democracia contra a surpresa, a imprevisibilidade", argumentou no ano passado.

Joaquim Barbosa: Defende que o Supremo acompanhe "interesses maiores da sociedade" em favor da moralidade no processo eleitoral. "Há de se prevalecer a ótica interpretativa de interesses maiores de toda a comunidade, que coíbam abuso no exercício de funções públicas. A lei complementar 135 Lei da Ficha Limpa se aplica de modo uniforme a todos os participantes da disputa, sem violar o principio da isonomia, e não gerou desequilíbrio entre as forças eleitorais em disputa", disse na época.

Ellen Gracie: Acredita que as regras de inelegibilidade têm por objetivo proteger valores democráticos e, por isso, podem ser aplicados já em 2010, sem a necessidade do cumprimento do princípio da anualidade. "Inelegibilidades são partes de um sistema jurídico próprio e instrumentos de proteção dos valores essenciais da democracia", afirmou no julgamento de 2010.

Cármen Lúcia: Defende que a Lei da Ficha Limpa não é casuística e sustenta que a legislação não alterou o processo eleitoral de 2010, podendo, portanto, ser aplicada já nas últimas eleições. "Probidade administrativa e moralidade são valores (...) autônomos, são valores constitucionais em si mesmo dignos de proteção. A Lei da Ficha Limpa busca Assegurar a proteção ética do processo e o direito de votar em quem o sistema estabelece que tem as condições de elegibilidade. Os valores dos direitos dos cidadãos sobrepõem aos valores particulares", argumentou a ministra no ano passado.

Carlos Ayres Britto: Ao defender a aplicabilidade em 2010, observa que o princípio da anualidade no caso da Lei da Ficha Limpa não precisaria ser cumprido porque a legislação tem por objetivo colocar em primeiro plano a moralidade dos candidatos. "Valores como moralidade (...) não comportam procrastinação ou quarentena. Como pode se exigir que lei protetora da probidade só entre em vigor daqui a um ano, seis meses, cinco meses? O cumprimento da probidade pode esperar? Um dia que seja pode ser de prejuízo irreparável", disse o ministro.

Ricardo Lewandowski: Presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), defende que a Lei da Ficha Limpa não estabelece penas aos candidatos, e sim condições de elegibilidade nas eleições. Com esse argumento, acredita que a legislação pode ser aplicada imediatamente e também para casos passados. "Por ocasião do registro são aferidas as condições de elegibilidade e as causas de inelegibilidade. As normas que alteram ou impõem a inelegibilidade não têm caráter penal, como também não configuram sanção. São regras de proteção da sociedade e estabelecem regras mínimas para o registro das candidaturas", afirmou.

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