Na sua primeira missa como papa, na manhã de hoje, no Vaticano, Leão 14 fez referências ao legado de Francisco, citou o Concílio Vaticano 2º - que buscou aproximar a igreja dos fiéis - e disse esperar que a igreja ajude a iluminar "as noites escuras deste mundo". "Que ela seja sempre mais uma cidade colocada sobre o monte, arca de salvação que navega através das ondas da história, farol que ilumina as noites do mundo", disse Leão 14. Ele também conclamou a congregação a intensificar sua atuação onde há "falta de fé". "Ainda hoje, não são poucos os contextos em que a fé cristã é considerada algo absurdo, destinada a pessoas fracas e pouco inteligentes; contextos em que se preferem outras seguranças, como a tecnologia, o dinheiro, o sucesso, o poder e o prazer." O Vaticano anunciou que a missa de entronização de Leão 14 será realizada no dia 18. Bastidores da escolha A agência de notícias italiana Ansa atribuiu ao cardeal de Nova York, Timothy Dolan, um papel central na articulação para a eleição de Prevost. Visto por muitos como um "representante de Trump no colégio cardinalício", segundo a agência, Dolan conseguiu unir os representantes americanos dos grupos anti-Trump com os conservadores e, depois, atraiu o apoio de cardeais africanos e asiáticos. O perfil multicultural de Prevost teria sido fundamental para o sucesso da manobra. De acordo com o relato da agência, o favorito Pietro Parolin foi prejudicado por divisões no bloco de prelados mais ligados ao papa Francisco - que tinha como candidatos também o francês Jean-Marc Aveline e o maltês Mario Grech - e pela polêmica em torno do acordo com o governo da China sobre a nomeação de bispos no país. Filho de FranciscoA ascensão de Robert Prevost na estrutura da Igreja Católica está diretamente relacionada ao papa Francisco. De formação agostiniana, Prevost nasceu e cresceu em Chicago, mas fez grande parte de sua carreira na igreja no Peru, onde se naturalizou em 2015. No país, foi nomeado pelo papa Francisco bispo de Sufar em 2014 e, no ano seguinte, bispo de Chiclayo, a quarta maior cidade peruana. Em 2023, foi transferido por Francisco para Roma e nomeado prefeito do Dicastério para os Bispos, um dos cargos mais importantes na estrutura do Vaticano - responsável pela nomeação de prelados no mundo todo. No mesmo ato, recebeu o título de arcebispo emérito de Chiclayo. Em setembro do mesmo ano, também por determinação de Francisco, se tornou cardeal de Santa Monica degli Agostiniani - o que lhe permitiu participar do conclave. "Na visão laica, um progressista"Estudiosos do Vaticano argumentam que a eleição de Leão 14 indica uma continuidade do pontificado de Francisco. "O centro simbólico da Igreja continua a se deslocar: geograficamente, para o chamado Sul Global; institucionalmente, para uma eclesiologia centrada na escuta, na mediação e no cuidado pastoral", escreveu, em artigo para a Folha de S.Paulo, o professor de antropologia da UFRJ Rodrigo Toniol. Segundo Toniol, porém, Leão 14 deve enfrentar resistências para manter essa agenda. "Os campos de tensão dentro da Igreja não desaparecem com uma eleição." Para o professor Virgílio Arraes, da Universidade de Brasília, Prevost é, "na visão laica, um progressista". Mas Arraes é cauteloso: "Há o exemplo de João Paulo 2º, que aparentava ser progressista, mas deu uma guinada ao conservadorismo. Só o tempo dirá". A cautela de vítimas de abusos e LGBTQIA+ Organizações de defesa de vítimas de abusos sexuais na igreja e de integrantes da comunidade LGBTQIA+ receberam a eleição de Robert Prevost como papa com cautela. Ele é acusado de negligência diante de denúncias de abusos contra padres nos EUA e no Peru. Também já criticou publicamente a mídia por fomentar "simpatia por crenças e práticas que estão em desacordo com o Evangelho", citando como exemplos "o estilo de vida homossexual" e "famílias alternativas compostas por parceiros do mesmo sexo e seus filhos adotivos". A Rede de Sobreviventes de Abusos por Padres disse ver a eleição do papa Leão 14 com "grande preocupação". A Glaad, uma organização internacional de combate à homofobia, declarou esperar que Leão 14 mantenha os avanços promovidos por Francisco e caminhe "rumo a uma Igreja mais compassiva". Reações internacionaisEm post na rede social X, o presidente Lula saudou Leão 14 e disse esperar que ele "dê continuidade ao legado do papa Francisco, que teve como principais virtudes a busca incessante pela paz e pela justiça social, a defesa do meio ambiente, o diálogo com todos os povos e todas as religiões, e o respeito à diversidade dos seres humanos." O secretário-geral da CNBB, dom Ricardo Hoepers, destacou a relação do novo papa com o Brasil. "Para nós, do episcopado do Brasil, é um grande presente. O papa Leão 14 conhece o Brasil e, com certeza, teremos todo o apoio dele naquilo que faz parte do nosso trabalho pastoral." Donald Trump destacou a nacionalidade de Prevost. "Que emoção e que grande honra para nosso país. Estou ansioso para conhecer o papa Leão 14. Será um momento muito significativo!" A primeira reação do presidente argentino, Javier Milei, na rede social X, foi mais seca: "As forças do céu deram claramente seu veredicto. Não há mais palavras, sr. juiz. Fim." Depois, em comunicado, Milei disse que recebia a notícia com "profunda esperança" e pediu que Leão 14 defenda "pilares" como a vida, a liberdade e a propriedade privada. Para trumpistas, um marxistaConservadores americanos e aliados de Trump criticaram a escolha de Robert Prevost como papa, informa o colunista do UOL Jamil Chade. "O primeiro papa americano da história foi alvo de críticas por ser considerado pelo movimento ultraconservador como 'marxista' e 'liberal'." "Mais um fantoche marxista no Vaticano", disse Laura Loomer, uma influenciadora que tem aconselhado Trump em temas de segurança nacional. "Não há nada de bom para os católicos no horizonte", disse. Dias antes do fim do conclave, Steve Bannon, ex-estrategista de Trump, alertou que Prevost seria "infelizmente um dos mais progressistas, um cavalo negro". Como cardeal, Prevost foi um crítico da política imigratória de Trump. Em seu último post na rede social X, ele compartilhou um texto que questionava Trump e o presidente Nayib Bukele sobre a deportação de estrangeiros dos EUA para El Salvador: "Vocês não veem o sofrimento? Sua consciência não se incomoda? Como podem ficar em silêncio?" |
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