Com o presidente
Valdemar Costa Neto envolvido no escândalo do Mensalão, partido chegou a se
chamar PR e elegeu Tiririca como deputado federal mais votado em 2010. Em
eleições presidenciais, lançou Afif em 1989 e se coligou a Ciro Gomes em 1998 e
a Dilma Rousseff em 2010 e 2014.
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Presidente Bolsonaro e o presidente do PL Valdemar Costa Neto. |
O presidente Jair Bolsonaro assinará
a filiação ao Partido Liberal (PL) nesta
terça-feira (30), interrompendo uma sequência de dois anos desde que o atual
mandatário ficou sem agremiação ao
sair do PSL, em novembro de 2019.
Considerado uma das legendas do
centrão — grupo de parlamentares no Congresso sem uma corrente ideológica
definida —, o PL será o nono partido
de Bolsonaro desde que o atual presidente entrou para a
política, no fim da década de 1980.
Bolsonaro, assim, irá para um partido
que, desde suas origens, mudou de posicionamento sobre
os presidentes e presidenciáveis que o Brasil teve a partir da redemocratização:
Lançou candidato próprio em 1989, o empresário Guilherme Afif Domingos;
·
Apoiou Ciro Gomes, à
época no PPS, em 1998;
· Teve José Alencar como candidato a vice-presidente na chapa de Lula (PT) em 2002,
que acabou eleita;
·
Aliou-se a Dilma Rousseff nas
candidaturas de 2010 e 2014, em ambas com vitória petista;
·
Participou da coligação de Geraldo Alckmin (PSDB) em
2018.
Além disso, é um partido que se
reformulou depois da união em 2006 com o
Partido da Reedificação da Ordem Nacional (Prona) — aquela
sigla liderada por Enéas Carneiro que colocava a 5ª Sinfonia de Beethoven no
horário eleitoral enquanto os candidatos faziam discursos ultranacionalistas
como a defesa à construção de uma bomba atômica brasileira.
Entre a união com o Prona e a
retomada do nome Partido Liberal, em maio de 2019, a sigla foi chamada de PR — Partido da República.
O PL também foi um dos partidos
envolvidos em 2005 no escândalo do Mensalão:
o presidente da sigla, Valdemar Costa Neto, foi condenado a 7 anos e 10 meses
de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O político cumpriu
prisão domiciliar em 2014 e recebeu o perdão da pena em 2016.
Hoje, o PL é um dos partidos mais
fiéis ao governo de Jair Bolsonaro no Congresso e tem a Secretaria de Governo,
ocupada pela ministra Flávia Arruda (PL-DF).
Ainda assim, há dissidências: o vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PL-AM),
tem um posicionamento mais crítico sobre o chefe do Executivo.
Leia mais sobre o Partido Liberal (PL),
o novo partido de Bolsonaro, abaixo:
Eleições: Afif,
FHC, Ciro, Lula, Dilma e Alckmin
O PL nasceu em junho de 1985, no
início da redemocratização no país. Naquele período, a política brasileira
começava a ver o surgimento de inúmeras siglas de orientações políticas
diversas, na esteira do fim do bipartidarismo Arena-MDB, encerrado na virada da
década de 70 para 80.
Assim, o PL lançou em 1989 — nas
primeiras eleições presidenciais desde a redemocratização — o primeiro e, até
agora, único candidato do partido a presidente: Guilherme
Afif Domingos, hoje assessor especial no Ministério da Economia.
Com os slogans "Juntos chegaremos lá" e "Dois patinhos na lagoa, vote Afif 22", o candidato
do PL terminou a eleição em sexto lugar. Ficou longe do segundo turno, mas
terminou à frente de nomes mais conhecidos da política naquele momento, como
Ulysses Guimarães (PMDB), Aureliano Chaves (PFL) e Ronaldo Caiado (PSD, à
época).
Fernando Collor (PRN) venceu aquela
eleição, renunciou depois de sofrer impeachment em 1992, e passou o bastão para
Itamar Franco.
De olho no pleito seguinte, o PL até
lançou o nome do empresário e então deputado federal Flávio Rocha para a
presidência em 1994. Mas o partido desistiu depois de denúncias de
irregularidades na campanha e aderiu, em seguida, à candidatura de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que acabaria eleito.
Quatro anos depois, em 1998, o PL
decidiu entrar na candidatura de Ciro Gomes, à época
no PPS (atual Cidadania). O partido integrou a coligação "Brasil Real e
Justo", mas o candidato ficou apenas na terceira posição, com pouco mais
de 10% dos votos. FHC foi reeleito já no primeiro turno.
A grande surpresa veio em 2002,
quando o PL não só anunciou o apoio a Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como
também indicou o candidato a vice: José Alencar,
senador mineiro e empresário do ramo têxtil. Foi uma ruptura do PT com a
tradição anterior de formar apenas chapas "puro sangue" ou com outros
partidos da esquerda ou centro-esquerda nas eleições presidenciais.
Lula se elegeu e, assim, o PL
conseguiu a vaga de vice-presidente com Alencar. O político mineiro, porém,
deixou o partido em 2005 para se filiar então ao Partido Municipalista
Renovador (PMR), que mudou de nome para Partido Republicano Brasileiro (PRB) —
o atual Republicanos.
Apesar da saída de Alencar do PL, o
partido continuou na base aliada de Lula, embora alguns nomes ficassem
individualmente na oposição. Em 2010 e em 2014, o PR chegou a integrar a
coalizão da petista Dilma Rousseff, que
se elegeu nas duas ocasiões. A ruptura veio em 2016, quando boa parte do
partido apoiou o impeachment e entrou na base do governo de Michel Temer.
Aí, em 2018, o PR participou da
coligação de Geraldo Alckmin (PSDB), chapa que
tinha como candidata a vice a senadora Ana Amélia (PP). O tucano, porém, viu os
votos do segmento mais à direita do eleitorado migrarem quase todos para Jair
Bolsonaro, e, assim, terminou apenas na quarta colocação com 4,76% dos votos —
o pior desempenho do partido em eleições presidenciais.
Mensalão, Enéas e
Tiririca
Um dos momentos mais duros para o
então PL foi o escândalo do Mensalão, que veio à tona em 2005 e atingiu o
presidente do partido, o então deputado Valdemar Costa Neto. Ele foi acusado de ter recebido dinheiro em troca de apoio no
Congresso ao governo do então presidente Lula.
Esse foi um dos maiores escândalos de
corrupção desde a redemocratização e afetou quadros do PT e de diversos
partidos que formavam a base aliada que até hoje compõem o chamado centrão: PL,
PP e PTB foram alguns dos mais afetados, além de quadros do então PMDB (atual
MDB).
Costa Neto foi condenado em 2012
a 7 anos e 10 meses de
prisão em sentença do Supremo Tribunal Federal (STF) pelos
crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Ele cumpriu a maior parte da
pena em regime aberto e, em 2016, recebeu perdão do
ministro Luís Roberto Barroso.
O escândalo afetou a imagem do
partido às vésperas das eleições gerais de 2006 — quando não teria mais o então
vice-presidente José Alencar no quadro.
Sob risco de não atingir os 5% dos
votos válidos para a Câmara dos Deputados na cláusula de barreira que sequer
chegou a entrar em vigor, o PL então decidiu se fundir em
2006 ao Partido da Reedificação da Ordem Nacional (Prona) e passou a se chamar
Partido da República (PR).
O Prona era o partido de Enéas
Carneiro, deputado federal eleito em 2002 e 2006 e que havia se candidatado ao
Planalto em 1989, 1994 e 1998 com um discurso ultranacionalista terminando
sempre no bordão "Meu nome é Enéas!". O
político, portanto, integrou o quadro do PR, mas apenas por um ano: ele morreu em 2007,
vítima de complicações causadas por um câncer.
Em 2010, o PL seria responsável por
outro fenômeno eleitoral: o humorista Tiririca, que
obteve a maior votação (1,3 milhão de votos em São Paulo) para deputado federal.
O bordão: "Pior do que 'tá', não fica", em referência à
crise política no Congresso e aos escândalos de corrupção.
Tiririca ainda se reelegeria em 2014
e 2018, sempre entre os mais votados deputados federais por SP, e sempre
puxando outros nomes menos conhecidos graças ao sistema proporcional.
E agora, com
Bolsonaro?
Ao sair do PSL, em 2019, Bolsonaro queria um
partido em que pudesse ter o controle — principalmente para
abrigar os outros políticos e apoiadores da mesma linha ideológica do
presidente, o que até se tentou com o PSL na época das eleições de 2018, mas acabou não dando
certo.
Bolsonaro, então, apostou na formação de um
partido bolsonarista, a Aliança Pelo Brasil. Mas a sigla acabou não
passando da fase de coleta de assinaturas e não decolou.
A legislação brasileira não permite uma
candidatura independente, sem partido. Por isso, se Bolsonaro quisesse se
candidatar à reeleição ou mesmo se decidisse tentar uma outra vaga nas eleições
de 2022, o presidente teria que se filiar a algum partido.
Chegou a negociar com o
Progressistas, do presidente da Câmara Arthur Lira, e recebeu convite do PTB,
de Roberto Jefferson. No final, acabou se decidindo pelo PL.
Embora não seja um partido tão
ideologicamente coeso, o PL está entre as siglas mais fiéis ao governo
Bolsonaro, votando em peso a favor do Planalto na maior parte das questões
sensíveis.
Mais recentemente, na PEC dos Precatórios
— que viabilizou o Auxílio Brasil mesmo com a possibilidade de furar o teto de
gastos —, o partido orientou o voto "Sim". Dos 43 parlamentares, só
dois deputados da sigla contrariaram o governo.