segunda-feira, 2 de junho de 2014

Livro conta trama macabra de Bruno e parceiros na morte de Eliza Samudio

Mário Magalhães

blog - vale bruno

“Puta que pariu!

É o melhor

goleiro do Brasil:

Bruno!''

Assim gritaram _gritamos_ os torcedores do Flamengo, reverenciando o goleiro do time campeão brasileiro de 2009. Já o aclamávamos dessa maneira fazia tempo.

Seis meses depois da conquista, Bruno foi um dos protagonistas da trama macabra que resultou em sequestro, assassinato e ocultação do cadáver da modelo Eliza Samudio.

De 2010 para cá, o campeão pegou no gol em peladas do presídio, onde também deu duro nos serviços da lavanderia. Condenado, continua em cana.

Um dos mais rumorosos episódios da crônica policial brasileira é reconstituído em minúcias no livro “Indefensável: O goleiro Bruno e a história da morte de Eliza Samudio” (Record), escrito pelos jornalistas Leslie Leitão, Paula Sarapu e Paulo Carvalho.

O lançamento no Rio ocorre nesta segunda-feira, a partir das 19h, na loja de Botafogo da Livraria da Travessa.

Li, de um fôlego só, o inventário de atrocidades. Os autores são repórteres que, por jornais concorrentes, cobriram o caso.

Por aversão a pitadas sádicas e temperos sensacionalistas de certo noticiário mundo-cão, não acompanhei com atenção os episódios sinistros da novela midiática deflagrada pelo crime.

Para quem, como eu, sabia pouco do ocorrido, o livro-reportagem permite entender início, meio e fim. Mas quem seguiu a investigação policial e o julgamento lance a lance também conhecerá informações inéditas.

Sabe aquele barraco que uma noiva formosa do Adriano aprontou numa favela do complexo da Penha, ao descobrir que o então atacante rubro-negro e colegas seus de time lá estavam na gandaia? Pois os jogadores do Flamengo presentes participaram, sem saber, de uma festa de ladrões que comemoravam o assalto de um carro-forte que lhes rendeu R$ 600 mil.

Às vésperas do julgamento de Bola, o exterminador de aluguel que asfixiou Eliza até a morte, pistoleiros tentaram executar o promotor. O representante do Ministério Público ocultou a tentativa de homicídio, receoso de que os jurados se sentissem intimidados e absolvessem o matador da modelo.

Para quem aterrissou ontem na Terra, passou-se o seguinte: Bruno, que ganhava cerca de R$ 250 mil mensais entre salário e patrocínio, não queria pagar pensão de R$ 3.500 ao filho que supostamente tivera com Eliza. O supostamente decorre da dúvida que ela própria nutria sobre a identidade do pai do bebê, como veio a se constatar mais tarde, por antigas mensagens na internet.

Como o goleiro resolveu a cobrança “inconveniente”, conforme concluíram a polícia, a promotoria e a Justiça, por meio do tribunal do júri? Planejando com seu dileto amigo Macarrão _e ordenando_ a morte da garota.

O corpo de Eliza jamais foi encontrado. É mérito do livro não cravar, por ausência de dados conclusivos, o paradeiro do cadáver. Há pelo menos duas hipóteses: foi jogado a cães rottweilers, que devoraram boa parte, e o que restou foi atirado num lago ou concretado; talvez tenha sido queimado numa fogueira de pneus.

O crime transformou o caráter de uma série de eventos que, de atos privados, passaram a ter relevância pública.

Os autores narram que Eliza engravidou numa suruba na casa do goleiro Paulo Victor, esse mesmo ainda hoje no Flamengo, e então reserva de Bruno. Que ela foi atriz em filmes pornô. E que se relacionava com outros boleiros. Em nenhum momento ocorre uma “segunda morte” moral ou editorial da modelo, que não só não é desclassificada, como é nitidamente preservada.

Durante certo tempo, cultivou-se dúvida sobre a morte de Eliza, que teria se mudado para o exterior, de acordo com as plantações de advogados dos réus. O processo judicial, recontado no livro, comprova que a garota foi mesmo assassinada, e até certidão de óbito em seu nome foi emitida. Bruno e Macarrão reconheceram o homicídio. As incertezas se restringem ao destino do corpo e à eventual participação de outros algozes.

Seguem algumas informações capturadas nas 265 páginas do livro.

Em 2010, fortalecidos pelo título nacional, os jogadores do Flamengo impuseram o fim dos treinos matinais, para que alguns deles conseguissem esticar madrugada adentro as farras. Curvada à cultura do chinelinho, de treinamentos pouco exigentes, a equipe degringolou.

Antes da final do Campeonato Estadual de 2009, Bruno tentou jogar com uma camisa falsificada do clube, com a figura do Demônio da Tazmania, personagem da Warner, empresa com a qual o Flamengo não mantinha contrato. O goleiro teimava em vestir uniforme personalizado. Para aparecer diferente, acabou trajando a camisa de treino.

Como capitão, Bruno tentou favorecer chapas seus no clube, na divisão do bicho pelo Brasileiro de 2009. O médico José Luís Runco, também da seleção, reagiu duramente, e acabou selada nova fórmula de distribuição do dinheiro.

De tão perdulário, Bruno chegou a pagar compra de roupas com um cheque no valor de R$ 107 mil.

Influente na equipe, o goleiro administrou conflitos do coração, como quando a cantora de funk Perlla, antes namorada do lateral Léo Moura, passou a conhecer melhor o zagueiro Álvaro.

Numerosas versões de Bruno e outros acusados e condenados são confrontadas aos históricos de telefonemas, localização dos interlocutores com base no rastreamento de celulares e registros de radares de ruas e rodovias. Documentalmente, as alegações do jogador e seus funcionários e amigos não se sustentam.

Quando Eliza sumiu, Bruno disse depois de um treino: “Ainda vou rir disso tudo”. Estava certo de que a impunidade o protegia. Por sorte, enganou-se.

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