Se o 0,01% é o último andar do triplex no alto do prédio mais luxuoso da sociedade brasileira, o 0,001% é a piscina dessa cobertura, o topo do topo. É uma piscina de borda infinita. Quem está nela olha os demais 150 milhões de brasileiros adultos de cima. Não tem ninguém sobre ele. Como ele - o Zero-Zero-Zero-1 -, há muito, muito poucos. O Zero-Zero-Zero-1 faz parte de um grupinho seleto, com apenas 1.492 associados, conta Toledo. Para entrar nele, é preciso ter uma renda mínima de 36 milhões de reais por ano. Mas, o Zero-Zero-Zero-1 típico ganha o triplo disso: na média, embolsa 112 milhões de reais por ano, o que equivale a R$ 300 mil ao dia. "Você pode pensar: isso dá R$ 12,5 mil por hora, não é lá muito mais do que cobra um cirurgião ou um advogado muito requisitado. A diferença é que, para ganhar tanto, o cirurgião e o advogado precisariam trabalhar 24 horas por dia, sete dias por semana, 365 dias por ano. O Zero-Zero-Zero-1 não precisa necessariamente trabalhar. Seu dinheiro trabalha por ele. Quanto mais dinheiro ele tem, mais o dinheiro rende - e, incrivelmente, menos imposto paga, proporcionalmente à sua renda." José Roberto de Toledo Esses dados fazem parte de um estudo publicado pelo Observatório Fiscal Europeu que investigou como super-ricos pagam impostos (ou não) no Brasil. A pesquisa foi conduzida por nove pesquisadores, brasileiros e estrangeiros, de universidades francesa, americana, do Banco Mundial e da Receita Federal. O estudo mostra que a concentração de renda no Brasil é significativamente maior do que se supunha e que os ultrarricos brasileiros pagam relativamente pouco imposto em comparação aos super-ricos de outros países. Os autores fizeram essa descoberta porque usaram uma metodologia mais sofisticada, continua Toledo. "Eles cruzaram os dados dos indivíduos com os de suas empresas. Com isso, puderam somar duas rendas: 1) a renda individual declarada ao Fisco, e 2) a renda não-distribuída, que fica nas empresas, mas que compõem o patrimônio e o poder econômico de seus sócios. Isso inclui também as empresas que estão em nome de outras empresas." Os pesquisadores construíram uma árvore societária que vai até o décimo nível de participação nas empresas para conectar as empresas aos seus respectivos sócios e acionistas. "Como resultado dessa floresta de participações empresariais diretas e indiretas, a renda econômica do Zero-Zero-Zero-1 é mais do que o dobro da renda declarada à Receita: R$ 112 milhões versus R$ 51 milhões." Ou seja, na prática, há dois sistemas tributários em vigor no Brasil: um para os super-ricos, e outro para os 150 milhões de adultos fora do triplex da cobertura. As regras são diferentes porque a fonte da renda é outra: não é o trabalho, mas o lucro das empresas, e das empresas das empresas, e das empresas das empresas das empresas, explica. A imensa maioria da população, a que vive abaixo do triplex na cobertura da sociedade brasileira, é tributada pela renda do seu trabalho, basicamente do seu salário. Já o Zero-Zero-Zero-1 não paga imposto sobre os dividendos que recebe, paga 15% em vez de 27,5% de IR graças a um mecanismo que só persiste no Brasil (juros sobre capital próprio), e ainda toma empréstimos a juros muito mais baixos do que o rendimento de suas próprias aplicações financeira. Tudo dentro da legalidade e sem contar o uso de paraísos fiscais. "O Zero-Zero-Zero-1 é o principal alvo do projeto de lei enviado pelo governo ao Congresso para compensar a isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil reais por mês. A proposta é que eles paguem um pouco mais, não muito mais, do pouco que pagam hoje: uma alíquota mínima efetiva de 10%. E é o Zero-Zero-Zero-1 que o Arenão de Ciro Nogueira e a oposição bolsonarista quer proteger do Leão", prossegue o colunista. Não serve de consolo, mas mesmo a concentração de renda e escapes tributários no "mundinho top" também é obscena. Os 152 indivíduos mais ricos entre os top Zero-Zero-Zero-1 (ou seja, os Zero-Zero-Zero—Zero-1) ganham em média R$ 492 milhões por ano (cerca de R$ 1,350 milhão por dia), ou quatro vezes mais do que os seus vizinhos de cobertura. "É sinal de que sendo um Zero-Zero-Zero-1, os outros 1 mil e 300 vão se achar pobres ao olharem para os 142 ultra-mega-híper ricos, e vão invejar os Zero-Zero-Zero-1", completa o colunista. |
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