Tem
dúvidas sobre qual das vacinas aplicadas no Brasil é a 'melhor'? G1 conversou
com 6 especialistas que foram unânimes: não é hora de escolher vacina.
Chegou a hora: é o seu dia de
ir ao posto tomar a vacina contra a Covid-19, mas você tem dúvidas sobre qual
delas é a melhor. Afinal, naquele grupo no celular, as pessoas te disseram para
tomar essa, aquela, ou talvez aquela outra. E agora, José?
Não tema. O G1 ouviu 6
especialistas e eles foram unânimes: você não deve escolher agora qual vacina
tomar. Há pouquíssimas exceções a essa regra (pessoas que não podem tomar uma
vacina específica por um motivo específico, como um problema de saúde).
Em resumo, é muito melhor
tomar qualquer vacina disponível do que ficar vulnerável à Covid-19. E, ao se
vacinar, você ajuda a aumentar a cobertura vacinal, que é o mais
importante neste momento.
RIO: Eduardo
Paes faz alerta a quem quer escolher vacina: 'Vamos parar com essa conversa'
Abaixo,
veja 5 razões que mostram por que você não deve escolher vacina:
Por que não devo escolher
minha vacina?
É urgente criar imunidade
individual contra a Covid
É preciso acelerar e aumentar
a cobertura da população
Não há vacinas suficientes
para o 'sommelier'
É prioridade evitar a
circulação do vírus e novas variantes
Salvar vidas é também uma
responsabilidade coletivaAlém dos cinco pontos acima, no fim da reportagem veja
ainda duas perguntas "bônus" sobre viagens e reações após a aplicação
do imunizante.
É
urgente ter imunidade individual contra a Covid
Todas as 3 vacinas aplicadas
no Brasil contra a Covid-19 são capazes de proteger de casos graves e de morte
pela doença. Isso já foi demonstrado tanto em ensaios clínicos (quando os
cientistas medem a eficácia de uma vacina) quanto na "vida
real" (quando a efetividade da vacina é constatada).
Sim, é verdade que as vacinas
têm eficácias diferentes (em estudos que foram conduzidos de forma distintas e
nem sempre são comparáveis). Mas a prioridade, neste momento, não é dar a
vacina de maior eficácia a todos ou escolher a própria vacina, defende a
epidemiologista Carla Domingues, que coordenou o Programa Nacional de
Imunizações (PNI) de 2011 a 2019.
As pessoas têm que entender
que é exatamente isso: as vacinas, todas elas, têm eficácias diferentes no
nível individual. Quando a gente olha o nível coletivo, todas elas têm uma
elevada eficácia para diminuição de gravidade, internação e óbito. Que é o
nosso objetivo agora", lembra Domingues.
Veja,
abaixo, exemplos que ilustram como a vacinação é um pacto coletivo:
CoronaVac
Nos ensaios clínicos, a
CoronaVac teve uma eficácia de 50,7% contra casos sintomáticos de Covid-19. Ela
também evitou 83,7% dos casos que precisaram de atendimento médico, mesmo dos
mais simples, e preveniu que houvesse internações
ou mortes por casos moderados ou graves de Covid-19.
Na "vida real", a
vacinação no Chile
mostrou que a Coronavac teve 80% de efetividade contra mortes por
Covid e de 89% contra casos graves. A vacina também
evitou casos e mortes no Uruguai.
No Brasil, o
estudo em Serrana (SP) mostrou uma queda de 80% nos casos sintomáticos da
doença quando cerca de 96% da população recebeu a CoronaVac. As
hospitalizações caíram cerca de 86%.
AstraZeneca/Oxford
Nos ensaios clínicos, a vacina
de Oxford/AstraZeneca teve eficácia
de 76% contra casos sintomáticos e de 100% contra casos graves. Mais tarde,
os cientistas descobriram que, se
o intervalo entre as doses fosse ampliado para 3 meses, a vacina tinha uma
eficácia ainda maior.
Ela também é capaz
de fornecer uma boa proteção apenas com uma dose, mas é necessário
tomar as duas.
Na "vida real", a
vacina conseguiu reduzir
o risco de internação por Covid-19 em até 94% na Escócia. Também há
estudos apontando que a vacina pode reduzir a transmissão do vírus, além da doença.
Pfizer
Nos ensaios clínicos, a
vacina da Pfizer teve a maior eficácia: conseguiu 95%. Na "vida
real", também teve
efetividade similar em alguns estudos, como em um feito em Israel. Também
há estudos apontando que ela
é capaz de impedir a transmissão da Covid-19, e não só um quadro de doença.
Janssen/Johnson
A vacina do laboratório
Janssen, do grupo Johnson & Johnson, foi aprovada para uso emergencial no
Brasil e chegou
ao país nesta terça (22).
Nos ensaios clínicos, o
imunizante, o único de apenas uma dose, teve eficácia
de 66% contra casos sintomáticos e 85% contra casos graves de Covid-19.
Ainda não há levantamentos de
efetividade da vacina na "vida real". Até agora, ela foi aprovada
para uso emergencial nos Estados Unidos, no Canadá, no Reino Unido, União
Europeia e pela Organização Mundial de Saúde (OMS),
mas só começou a ser aplicada depois de outras vacinas – como a de
Oxford/AstraZeneca, da Pfizer e da Moderna.
2)
Acelerar e aumentar a cobertura vacinal
Os especialistas ouvidos
pelo G1 são unânimes em afirmar que o mais importante agora é
acelerar a vacinação, além de aumentar a cobertura vacinal. É necessário
vacinar a maior quantidade de pessoas no menor tempo possível.
Quanto mais tempo se leva para
atingir uma alta cobertura vacinal, maior é o tempo que as pessoas não
vacinadas passam podendo se infectar – aumentando a chance de novos casos e
mortes.
"Do ponto de vista da
campanha, é mais efetiva a velocidade, e não necessariamente a vacina
[aplicada]. É importante as pessoas tomarem as vacinas que tiverem. O que
conta é a velocidade. Se conseguir vacinar muitas pessoas de forma rápida,
consegue impactar a curva", explica a epidemiologista Ethel Maciel,
professora titular da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).
Um ponto importante sobre a
cobertura vacinal é que as vacinas usadas no Brasil têm, no geral,
eficácia menor do que as usadas nos Estados Unidos, por exemplo (que
aplica Moderna, Pfizer e Johnson). Isso significa que é preciso vacinar
uma maior quantidade de pessoas para frear a transmissão do vírus.
No estudo em Serrana (SP),
os cientistas avaliaram que o controle da pandemia foi feito depois que 75% da
população recebeu a segunda dose da CoronaVac. Ou seja: para
controlar a pandemia é preciso que muitas pessoas vacinem.
"O
que a gente precisa é que as pessoas sejam vacinadas. Se cada grupo que chegar
falar 'não, eu vou deixar [a vacina A ou B] pro outro', o outro não vai ser
vacinado. Não pode ser uma atitude individual", reforça Carla Domingues.
E, se isso não acontecer, é
possível que mesmo as vacinas com maior eficácia não sejam capazes de proteger
as pessoas de adoecerem, explica a pediatra Isabella Ballalai, vice-presidente
da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm).
"O
sucesso de um programa de vacinação depende [em primeiro lugar] de cobertura
vacinal. E a gente está acostumado com o resultado de outras vacinas – que, na
verdade, são resultados de um panorama de alta cobertura vacinal. Mas a gente
viu, por exemplo, o sarampo – que tem uma vacina com 98% de eficácia – voltar
porque baixou a cobertura", lembra Ballalai.
Além de deixar a população
vulnerável, quanto maior o tempo que o vírus leva circulando, maior é a chance
de que surjam novas variantes (veja detalhes na pergunta 4).
3)
Não há vacinas suficientes para o 'sommelier'
Nos restaurantes, sommelier é
o especialista na carta de vinhos ou de bebidas. No atual momento, o
"sommelier de vacina" virou um termo crítico para representar aqueles
que escolhem supostamente o que acham ser o melhor. É importante lembrar que o
Brasil não tem doses suficientes de nenhuma vacina para imunizar toda a
população. Por isso, infelizmente, nem todos poderão ser imunizados com as
vacinas que tiveram maior eficácia nos estudos.
Após
rejeitar ofertas de vacinas da empresa, Bolsonaro pede à Pfizer para antecipar
entregas
"Não existe uma única
vacina que tenha a capacidade de produção de garantir que todos os brasileiros
fossem vacinados em curto prazo de tempo com a melhor vacina. É por isso que
está se vacinando com vacinas diferentes, porque o que a gente quer é ter o
maior número de pessoas vacinadas num curto prazo de tempo", explica Carla
Domingues.
Segundo a última previsão
do Ministério
da Saúde, atualizada na quarta-feira (16), o Brasil deve dispor ao todo, em
junho, de cerca de 38 milhões de doses de vacina (37.948.181), distribuídas da
seguinte forma:
Oxford/AstraZeneca: cerca
de 20 milhões de doses, sendo 18 milhões da Fiocruz e o restante
da Covax Facility.
CoronaVac: cerca de 5
milhões de doses do Instituto Butantan.
Na quarta-feira (16), o
Butantan entregou 1 milhão de doses ao Ministério da Saúde.
Pfizer: cerca de 12,8
milhões de doses, sendo 12 milhões direto da Pfizer e o restante da Covax
Facility.
Além dessas, mais 1,5 milhão
de doses da vacina da Johnson – que não estavam previstas no cronograma –
chegaram ao Brasil no dia 22, levando o total de junho a cerca de 39,5 milhões
de doses.
"Se
você vai escolher vacina, provavelmente vai ficar sem vacina. E se você ficar
sem vacina, várias pessoas vão ficar sem vacina porque escolheram. E aí a gente
não vai resolver essa pandemia nunca", alerta.
4)
É prioridade evitar a circulação do vírus e de novas variantes
Quanto mais o vírus circula,
sendo transmitido de uma pessoa para outra, mais ele faz replicações, e maior é
a probabilidade de modificações, ou mutações, no seu material genético. É
daí que surgem as novas variantes.
Essas variantes do vírus podem
ou não ser resistentes às vacinas disponíveis hoje; quanto mais variantes
surgem, entretanto, maior é a probabilidade de que uma delas seja resistente a
uma ou a várias vacinas.
Já há dados que apontam que
algumas vacinas não funcionam tão bem contra determinadas variantes – como a da
AstraZeneca contra a variante
sul-africana (beta/B.1351).
Mas, mesmo nesse caso, a
vacina evitou casos graves e mortes, lembra o imunologista Jorge Kalil,
pesquisador do Instituto do Coração (Incor) da Universidade de São Paulo (USP).
"As
pessoas não sabem qual é a variante que vai chegar até elas. Nós ainda não
temos dados suficientes sobre todas as variantes. O
número de novos casos e o número de mortes estão enormes. Tem que
tomar o que aparecer; esse momento não é de esperar, é de tomar o que estiver
disponível", afirma Kalil.
O cardiologista Marcio
Bittencourt, pesquisador do Hospital Universitário da USP, lembra, também,
que não sabemos quais são as próximas variantes que vão circular – e como
vão agir contra as vacinas de hoje.
"Depende
da variante que está circulando. A gente não sabe qual é a próxima variante que
vai circular daqui a dois meses. Então você não está garantindo uma proteção
melhor com nenhuma das vacinas para daqui a 2 ou 3 ou 4 ou 5 meses. Daqui a 6
meses pode ter uma cepa que a Pfizer não funcione e que a CoronaVac funcione.
Não tem como saber", pondera.
Ballalai reforça: é
necessário, urgentemente, diminuir o número casos no país.
"Porque
senão vai perder essa oportunidade. Vamos criar variantes novas aqui no país: o
Brasil é considerado celeiro de variantes. Até a hora em que a gente vai ter
uma variante contra a qual a vacina não vai conseguir proteger. Aí, sim, a
gente está com um problema sério", alerta.
É o mesmo caso, por exemplo,
da vacina da gripe, compara Bittencourt: todo ano uma nova vacina é feita de
acordo com as cepas que os cientistas calculam que vão circular naquele ano.
"Se a gente erra a cepa, a vacina fica ruim", diz o médico.
5)
Salvar vidas é também uma responsabilidade coletiva
"A
vacinação é um ato de responsabilidade social – para eu me proteger e proteger
todo mundo à minha volta. Quando eu fico escolhendo vacina, estou pensando só
em mim", afirma Carla Domingues.
Ao se vacinar, aumentar a cobertura vacinal e reduzir a circulação do vírus, você protege a si mesmo e às pessoas ao seu redor – incluindo aquelas que ainda não podem se vacinar, seja porque ainda não estão contempladas no plano de vacinação, porque são crianças ou porque têm algum problema de saúde que as impede.
VIDAS SALVAS: Pesquisa
da UFPel e Harvard aponta que vacinação evitou morte de 43 mil idosos por Covid
no Brasil
"Quanto
mais cedo você [se] vacina, mais cedo protege quem mora, trabalha e convive com
você. Quanto mais você espera para [se] vacinar, mais deixa exposto não só você
mesmo, como todo mundo que convive com você – quer as outras pessoas estejam
vacinadas ou não, porque a vacina é para proteger o todo, não uma pessoa",
explica Marcio Bittencourt, da USP.
"Se
você atrasa a sua [vacina], deixa o todo ao seu redor desprotegido ou mais
desprotegido. Se uma família inteira atrasa a vacina esperando uma vacina que
eles acham que vai ser melhor, eles podem todos pegar Covid antes de a vacina
chegar. Não tem vantagem nenhuma", afirma.
Quando a circulação do vírus
cai, mais pessoas se vacinam e há menos gente suscetível à doença, cai o número
de casos e a probabilidade de que alguém desenvolva um caso grave. Assim, cai o
número de pessoas internadas e não há a sobrecarga
do sistema de Saúde, que foi vista em praticamente todo o país neste ano.
E, claro, milhares de mortes são evitadas.
"Eu
me vacino para proteger meu filho, que não vai ter acesso à vacina agora, meu
pai, que mesmo vacinado ainda pode adoecer, porque nos idosos a capacidade de
produzir anticorpos é menor. Como é que a gente evita a circulação do vírus? É
vacinando o maior número de pessoas no menor prazo de tempo. Por isso, não tem
sentido estar escolhendo vacina", reforça Carla Domingues.
'Se
eu tomar a vacina X, poderei viajar?'
Até agora, não há informação
de que pessoas imunizadas com a vacina A, B ou C tenham sido impedidas de
viajar ou de entrar em algum país. Há duas semanas, a
Espanha reabriu as fronteiras para turistas vacinados com alguma das
vacinas aprovadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) ou pela União
Europeia. Todas as vacinas usadas no Brasil são aprovadas pela OMS, mas o país
ficou de fora da lista por ser de "especial risco epidemiológico".
"A partir do momento que
a Covax vai aprovando as vacinas, muito provavelmente todos os países
aceitarão", opina Ethel Maciel, da Ufes.
'Mas
e os efeitos colaterais?'
Você já deve ter ouvido falar
nos casos de trombose após a aplicação da vacina da AstraZeneca. Esse risco,
entretanto, é raríssimo – e bem
menor do que o de desenvolver um coágulo após a própria Covid, segundo
cientistas de Oxford.
Vacina
AstraZeneca: quais os sintomas, as reações e os possíveis efeitos colaterais
entre vacinados?
Vacina AstraZeneca: quais os
efeitos colaterais mais comuns?
Alguns países estão
substituindo a segunda dose da vacina por outras de RNA mensageiro – como a da
Pfizer e a da Moderna. A epidemiologista Ethel Maciel defende que essa
possibilidade de combinação deve ser estudada no Brasil.
"Por exemplo, várias
gestantes tomaram a AstraZeneca antes de interromperem [a aplicação].
Essas gestantes poderiam tomar
agora a Pfizer como uma segunda dose. Já tem alguns estudos de
intercambialidade. Inclusive o próprio Ministério da Saúde já tem dados de
pessoas que tomaram errando. Poderia completar o esquema de várias pessoas:
pessoas que tiveram reação à AZ na primeira", opina.
Nenhum comentário:
Postar um comentário