“Ao menos por enquanto e na presente fase procedimental, não diviso prova inequívoca e bastante o suficiente (art. 273, caput, CPC) para impor à parte ré determinação judicial de se abster do exercício jornalístico de divulgação de fatos relacionados ao desempenho da parte autora enquanto figura pública (Secretário Municipal de Saúde), máxime e até porque a conduta da imprensa, em um Estado Democrático de Direito, se mostra, em primeiro plano, salutar à consolidação das liberdades públicas. Por outro lado, também não vislumbro de imediato o abuso da liberdade de imprensa intenso o suficiente a autorizar a pronta censura”.
André Bogéa Pereira Santos (Juiz de Direito da 2ª Vara de Açailândia)
Açailândia – O surgimento das redes sociais (Orkut, Myspace, blogs, Facebook, Twitter, dentre outros, além dos mais recentes Ning e Google Friend Connect) pode ser considerado um marco na história da humanidade, assim como foi o da própria internet. Hoje, não se consegue mais imaginar o mundo sem internet e, consequentemente, sem as redes sociais, que permitem, acima de tudo, a discussão de assuntos relevantes da maneira mais democrática possível. O blog se destaca no mundo inteiro e vem ganhando cada vez mais adeptos no Brasil.
Em Açailândia o Blog Wilton Lima e outros poucos vêm fazendo sistematicamente o papel da mídia livre, com críticas e cobranças ao poder público municipal em virtude aos graves problemas instalados na cidade.
A cobrança feita a políticos pelas redes sociais no Brasil, no entanto, vem sendo questionada, desde quando começou a incomodar principalmente a quem tem muito a esconder, principalmente os políticos sem compromissos com a sociedade, e com processos na Justiça, acusados de vários crimes, principalmente os eleitorais.
No ano passado, choveu de ações nos Tribunais Regionais Eleitorais (TRE) e no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) contra jornalistas que denunciavam os crimes eleitorais em seus blogs e no Twitter.
O Blog Wilton Lima é o primeiro, em Açailândia, a enfrentar as barras da Justiça por críticas ao poder público municipal. O secretário municipal de saúde de Açailândia, Juliano Sales Roudi pede na 2ª Vara, Antecipação de Tutela para proibir o blog a divulgar ou criticar qualquer ação da secretaria de saúde do município.
Censura negada
Leia abaixo, na íntegra, a decisão do juiz Dr. André Bogéa Pereira Santos publicada nesta segunda-feira (04/04/2011):
Após cognição sumária, suficiente apenas à análise do pedido de antecipação de tutela, constato que o caso encerra questões referentes à atuação da imprensa, precisamente à divulgação de blog da parte ré, publicado na internet. Neste particular, se impõe a perspectiva ditada pelo Supremo Tribunal Federal em sede da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n.º 130/DF, da relatoria do Min. Carlos Britto, que declarou não recepcionado pela Constituição Federal de 1988 "todo o conjunto de dispositivos da Lei n.º 5.250/1967 (Lei de Imprensa)", trazendo como um dos resultados diretos a supressão de todos os mecanismos infraconstitucionais de disciplina e monitoramento da atividade da mídia. Eventuais abusos no exercício da liberdade de imprensa passaram a ser tratados pela legislação ordinária (Código Penal, Código Civil etc). Ao menos por enquanto e na presente fase procedimental, não diviso prova inequívoca e bastante o suficiente (art. 273, caput, CPC) para impor à parte ré determinação judicial de se abster do exercício jornalístico de divulgação de fatos relacionados ao desempenho da parte autora enquanto figura pública (Secretário Municipal de Saúde), máxime e até porque a conduta da imprensa, em um Estado Democrático de Direito, se mostra, em primeiro plano, salutar à consolidação da liberdades públicas. Por outro lado, também não vislumbro de imediato o abuso da liberdade de imprensa intenso o suficiente a autorizar a pronta censura. Do exposto, indefiro o pedido de antecipação da tutela. Para a realização da audiência de conciliação, designo o dia 20/09/2011, às 12h, no local de costume. Cite-se a parte ré, por via postal (art. 222, caput, CPC), a fim de que compareça àquela audiência - podendo se utilizar de preposto, desde que com poderes para transigir (art. 277, §3º, CPC) -, oportunidade em que, caso não haja conciliação, deverá apresentar defesa, escrita ou oral, por meio de advogado, sob pena de serem reputados verdadeiros os fatos deduzidos na petição inicial (art. 277, § 2º, CPC). Cientifique-se ainda a parte ré de que poderá, em sua contestação, apresentar documentos, rol de testemunhas e, caso pretenda protestar por perícia, fornecer desde logo os quesitos e indicar assistente técnico (art. 278, caput, CPC). Intimem-se as partes e seus respectivos advogados. Açailândia, 23 de março de 2011 André B. P. Santos Juiz de Direito da 2ª Vara de Açailândia.
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