segunda-feira, 30 de maio de 2016

Votar ou não votar, eis a questão...

... Diminui no país o número de eleitores jovens


Adiando a decisão

Mensalão, petrolão, máfia da merenda, Lava Jato, cartel do metrô, réu no comando da Câmara. Em meio a um cenário político recheado de crises e denúncias, os adolescentes estão evitando tirar o título de eleitor para votar enquanto ainda não são obrigados a exercer esse direito.

A quantidade de eleitores com idades entre 16 ou 17 anos está caindo desde os pleitos municipais de 2012, último ano eleitoral antes do começo da onda de protestos pelo país, iniciada em junho de 2013, a partir do aumento das tarifas do transporte público na Grande São Paulo.
Há quatro anos, 2,9 milhões de adolescentes possuíam título de eleitor. Esse grupo representava 2% do eleitorado brasileiro e 42% da população com 16 ou 17 anos de idade. Por questões de confidencialidade do voto, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) não informa quantos desses garotos e garotas efetivamente votaram.
Os dados mais recentes do tribunal referem-se a abril de 2016 e mostram uma queda de 55% em relação ao pleito de quatros anos atrás. Se a eleição fosse hoje, estariam aptos a votar 1,3 milhão de adolescentes, o equivalente a 0,9% da população eleitoral. Se confrontados com os números do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), esse grupo representa 19% dos brasileiros com 16 ou 17 anos de idade.
Ainda que a população esteja envelhecendo, uma queda nessas proporções mostra que há uma grande descrença na política. Os jovens brasileiros acham que nenhum político presta e que eles não fazem diferença nenhuma na vida deles .
A polarização política é um dos fatores para a queda desse número. Lucca Sokabe, por exemplo, completou 17 anos e não pretende tirar o título de eleitor para votar nesta eleição. “Eu acho que esse é o problema que a gente tem hoje em dia: as pessoas não conseguem escolher uma posição e defendê-la. Então, para evitar esse constrangimento da minha parte, eu prefiro ter mais tempo para me informar, pesquisar sobre ideologias, sobre o que o candidato quer.”
Enzo Snitovsky, 16, já tirou seu título de eleitor para votar na eleição municipal de outubro. Ele, porém, separa o processo de escolha de uma candidatura da tentativa de entender o que está acontecendo no país hoje. “É bem confusa essa situação política do Brasil. Tenho até um pouco de medo de me posicionar”, comenta. “Na sociedade, cada um é um ser político e a atuação de todos leva a uma transformação da sociedade. Independentemente de pensar que meu voto sozinho vai levar a alguma coisa, a minha responsabilidade é votar, expor as minhas ideias e esperar que eu consiga auxiliar com o futuro do país.”
Francisco Braga, 17, diz que votar pela primeira vez não é o mais importante para se fazer ouvir na sociedade. “Acho que é importante ir votar por mais que eu ache que as mudanças não vão vir por aí. Acho que as mudanças vão vir das ruas, das manifestações populares. Mas já que dão a oportunidade de a gente votar, a gente aproveita e vota para escolher.”

Mais do que o voto

A primeira vez que os adolescentes puderam votar foi também a primeira vez que os brasileiros puderam escolher um presidente depois de 29 anos, intervalo que engloba a eleição de Jânio Quadros, em 1960, sua renúncia, em 1962, o golpe civil-militar que tirou João Goulart da Presidência, em 1964, os 21 anos de ditadura militar e o período de redemocratização até a eleição presidencial de 1989, já com voto direto.
Mas o voto não representa todas as possibilidades que os adolescentes têm de atuação na política. Sophia de Castro, 16, vai votar, mas ressalta que “não necessariamente o jovem politizado precisa votar ou tirar título”. “Porque política é muito maior do que eleição. Na verdade, eu acho que eleição não é nada perto do que a gente pode fazer.” Sokabe, 17, tem uma visão parecida: “Acho que a população acredita que o exercício democrático é pautado só no voto e outros fatores da democracia são deixados de lado”.
Perceber outras formas de fazer política reflete-se na diferença entre o número de quem tem título já aos 16 anos e o de quem o tira aos 17 anos. Em 2012, três em cada cinco dos adolescentes aptos a votar (60,2%) possuíam 17 anos. Em 2016, essa relação passou a ser de quatro entre cinco (81,8%).
A visão de o voto não ser a única “arma política” agrada à Ubes (União Brasileira dos Estudantes Secundaristas). A entidade foi uma das principais articuladoras da inclusão do direito ao voto facultativo de adolescentes de 16 ou 17 anos na Constituição de 1988.
O voto é parte de um processo importante, mas não pode só depositar o seu destino. O voto não é o fim
Camila Lanes, 19, presidente da Ubes
Em 1989, na primeira vez em que os adolescentes puderam participar pelas urnas, eram 3,1 milhões de pessoas com 16 anos ou 17 anos aptas a votar, cerca 2,9% do eleitorado. O número de jovens com título de eleitor ainda aumentou para a eleição municipal de 1990, com 3,2 milhões de adolescentes, representando 3,5% dos eleitores brasileiros na época.
A partir de então, considerando os anos eleitorais, a proporção de adolescentes no eleitorado sempre esteve próximo dos 2%, com exceção de 1996 (1,02%) e 2000 (0,82%), patamares semelhantes aos vistos em 2016 até o momento.
"A gente observa, agora, que existe um movimento diverso do que havia nos anos 1980 e 1990. Naquela época, havia uma grande politização dos jovens, mas com um viés de esperança e de atuação partidária”, diz Cláudio Couto, cientista político da FGV (Fundação Getúlio Vargas).
Agora, a gente até vive um momento de ebulição e muita discussão política, mas o momento é de descrença em relação aos políticos e aos partidos. Especialmente entre os mais jovens.
Cláudio Couto, cientista político da FGV
Giovana Rezende, 16, concorda. “Conheço amigos meus que escolhem não ler sobre política, não opinar. Eu acho isso muito errado porque o mundo, o mundo corporativo, seu trabalho, seus amigos vão exigir isso de você, uma opinião. Porque você é um cidadão que precisa falar o que acha.”

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