Em Bom Jardim, que fica a cerca de 275 km de São Luís, alunos estudam em igrejas e casas improvisadas. Município recebeu mais de R$ 650 milhões do Fundeb (o principal fundo de financiamento da educação) nos últimos 13 anos.
Lidiane Leite, ex-prefeita de Bom Jardim, que ficou conhecida como "Prefeita Ostentação" por causa de seu comportamento nas redes sociais. — Foto: Arquivo pessoal
Por Redação g1, Fantástico
Em Bom Jardim, cidade
de pouco mais de 33 mil habitantes no interior do Maranhão, escolas
interditadas, salas improvisadas em igrejas e até aulas em casas de moradores
são retratos de um descaso do poder público com a educação. Nos últimos 13
anos, o município recebeu mais de R$ 650 milhões em verbas públicas para a
educação e, ainda assim, enfrenta uma realidade de abandono e precariedade.
O histórico é tão grave quanto
repetitivo: dos últimos cinco prefeitos, quatro foram condenados por corrupção
ou improbidade administrativa. Entre eles está a ex-gestora Lidiane Leite, que
ficou conhecida em todo o país como a "Prefeita Ostentação" por
exibir uma vida de luxo nas redes sociais enquanto o ensino municipal
desmoronava.
Lidiane foi presa, acusada de
desviar cerca de R$ 15 milhões que deveriam ser destinados ao ensino público. A
ex-prefeita tem 10 condenações, que somam quase 40 anos de prisão.
Entre 2013 e 2020, todos que
passaram pelo cargo de prefeito foram condenados. Após Lidiane, assumiu a vice,
Malrinete Gralhada, condenada a 15 anos por desvio de dinheiro. Em 2016, Manoel
da Conceição Pereira Filho, o Sinego, assumiu por 70 dias, tempo suficiente
para desviar R$ 600 mil. Francisco Alves Araújo (2017-2020) foi afastado três
vezes por corrupção e improbidade.
Fábio Oliveira, promotor
responsável pelas investigações de todos eles, aponta uma cultura de corrupção.
"Eles já ficavam esperando a vez deles entrarem, já para se corromper,
para poder sugar o dinheiro que tinha em Bom Jardim", disse.
Lidiane e Malrinete foram condenadas criminalmente, mas recorrem em liberdade. Francisco e Manoel tiveram condenações na esfera civil.
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| Em Bom Jardim (MA), quatro dos últimos cinco prefeitos foram condenados por desvios ou improbidade administrativa. — Foto: Reprodução |
Imagens do descaso
O retrato do descaso é visto no caminho diário de Eudinete e seus seis filhos. Eles caminham por uma estrada de terra até uma pequena igreja. O local, porém, não é usado para missas, mas como sala de aula improvisada. O prédio original onde a escola funcionava foi interditado por risco de desabamento. Eudinete, que trabalha no local como zeladora, merendeira e vigilante, sonha com o básico para os filhos: "Um banheiro, pelo menos um."
A equipe de reportagem passou por
onze povoados e encontrou sinais de descaso por toda parte. Na escola
improvisada na igreja, o estudante Jean, de 7 anos, observa: "Aqui nem é
de verdade. Parece que aqui é só uma igreja." Em outro povoado, Dona
Elivânia oferece a própria casa para que os filhos e outras crianças tenham
onde estudar há mais de 10 anos. Questionada sobre o que falta, ela resume:
"O que falta é a escola mesmo ser construída."
Banheiro é item raro; em um
local, é apenas um cercado de palha, em outro, uma estrutura inacabada. "A
gente tem que ir pra dentro do mato, porque tem um banheiro ali que nem vaso
não tem", conta um estudante. Em outra escola, onde o professor Antônio
trabalha, a água usada pelos alunos vem de um poço cheio de insetos.
Professores se desdobram para
lidar com a situação. Em uma das salas improvisadas, uma professora atende
crianças de idades diferentes ao mesmo tempo. "O rebolado é grande. Eu
tento me multiplicar o máximo que eu posso", diz ela, que admite: "A
defasagem é bem grande."
Enquanto isso, estruturas de
alvenaria, que poderiam ser escolas, estão abandonadas. Um prédio foi fechado
há 10 anos para uma reforma que nunca aconteceu e hoje está com a estrutura
deteriorada.
Em Bom Jesus (MA), quatro dos
últimos cinco prefeitos foram condenados por desvios ou improbidade
administrativa. — Foto: Reprodução
Prefeita atual também é
investigada
A atual prefeita, Cristiane Varão
(PL), é ex-professora da rede municipal e foi reeleita em 2024. Apesar de
prometer a construção de novas escolas, ela própria é investigada pela Polícia
Federal e pelo Ministério Público por suspeita de desvio de verbas e corrupção.
“É uma cidade extensa e não tem
como resolver todos os problemas em quatro anos”, disse em entrevista. “Mas
temos planejamento para reconstruir todas as escolas que ainda funcionam de
forma desumana.”
Questionada sobre as
investigações, Cristiane afirmou: "Quando formos comunicados, iremos
responder."
O que dizem as defesas
Em nota, a defesa de Lidiane
Leite disse que a grande maioria dos processos já foi arquivada, que existem
processos a serem julgados e outros que ainda estão em fase de recurso. E que
considera que não há nenhuma pena a ser cumprida.
A defesa de Manoel da Conceição
Pereira Filho negou que ele tenha utilizado o cargo para obter vantagens. Disse
que ele sofreu pressão política e foi induzido a assinar documentos e que
exerce o direito de defesa com serenidade e lealdade.
A defesa de Francisco Alvez
Araújo disse que ele foi afastado do cargo por causa de processos marcados
pelos grupos políticos que travam uma guerra na cidade. E que responde com
serenidade às ações judiciais.
O Fantástico tentou
contato com a defesa de Malrinete Gralhada, mas não obteve retorno.


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