segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Nova lei prevê desempenho mínimo nas urnas para candidato a vereador

‘Nota de corte’ exige de candidato ao menos 10% do quociente eleitoral.

Regra aprovada em 2015 será aplicada pela primeira vez neste ano.

Fernanda Calgaro
Do G1, em Brasília
Uma mudança na legislação aprovada pelo Congresso na reforma eleitoral do ano passado – e que será aplicada pela primeira vez na eleição deste ano – estipulou uma espécie de “nota de corte”, diferente em cada cidade, para um candidato a vereador se eleger.
Pela nova regra, os candidatos a deputado federal, deputado estadual e vereador necessitarão obter, individualmente, um total de votos de pelo menos 10% do quociente eleitoral, que é calculado dividindo-se o número de votos válidos da eleição (sem brancos e nulos) pelo número de cadeiras disponíveis na Câmara dos Deputados, na Assembleia Legislativa ou na Câmara Municipal.
COMO É FEITO O CÁLCULO
>> Ao final do primeiro turno, a Justiça eleitoral apurou que houve 100 mil votos válidos (excluídos brancos e nulos) no município hipotético de Campo Feliz.
>> Com base nesse número, calcula-se o quociente eleitoral, que determina o mínimo de votos que um partido ou coligação necessita para conseguir vagas na Câmara Municipal de Campo Feliz. Esse quociente é calculado pela divisão do número de votos válidos pelo total  de vagas que existe na Câmara.
>> A Câmara de Campo Feliz tem 10 vagas de vereador. Portanto, para ter direito a uma vaga, um partido ou coligação necessita de pelo menos 10 mil votos (somados os votos individuais em candidatos e os votos dados à legenda).
>> A novidade introduzida pela reforma eleitoral de 2015 é que, no exemplo de Campo Feliz, mesmo que o partido tenha alcançado os 10 mil votos, só poderá preencher a vaga se um dos candidatos a vereador desse partido tiver conquistado mil votos (10% do quociente eleitoral) ou mais.
>> Se o partido não tiver um candidato com o mínimo de votos exigido, essa vaga é transferida a outro partido ou coligação após novo cálculo.
 








Isso está fazendo com que, na campanha deste ano, partidos peçam aos seus eleitores para que abandonem a prática do voto de legenda (aquele em que o eleitor vota só no partido e não especificamente em um candidato) – leia mais abaixo.
O voto de legenda se soma aos votos que os candidatos obtêm individualmente para fins de se calcular o quociente partidário, que determina o número de vagas na Câmara Municipal ao qual o partido (ou coligação) terá direito – para isso, divide-se o número de votos válidos que o partido ou coligação obteve pelo quociente eleitoral.
Com a mudança introduzida pela reforma eleitoral do ano passado, o voto na legenda contribui para o quociente partidário, mas não ajuda os candidatos a vereador, individualmente, a alcançar os 10% do quociente eleitoral.
Um exemplo: se em determinado município, houve 100 mil votos válidos na eleição, e as cadeiras em disputa na Câmara são 10, o quociente eleitoral é 10 mil.
Nessa hipótese, com a nova regra, o candidato precisa de pelo menos mil votos (10% de 10 mil) para ter chance de se eleger.
Assim, se um partido recebeu 50 mil votos (somados os votos em candidatos e na legenda), e o quociente eleitoral é 10 mil, o resultado da conta dá 5. Portanto, o partido terá direito a cinco vagas.
Se, por hipótese, o quarto e o quinto colocados desse partido não alcançaram, na votação individual, 10% (mil votos) do quociente eleitoral (10 mil votos), o partido perderá essas duas vagas e ficará somente com três.
Nesse caso, a Justiça Eleitoral fará um novo cálculo, e as duas vagas serão transferidas para outro partido ou coligação cujos candidatos cumpram o requisito.
A mudança na lei também tira força dos chamados “puxadores” de voto, candidatos que, sozinhos, têm grande votação e acabam garantindo ao partido (ou coligação) outras vagas além da sua própria.

Se a nova regra estivesse em vigor na eleição de 2014, que escolheu os atuais deputados federais, a bancada de São Paulo do PRB teria ficado com duas vagas a menos.
Naquela eleição, o quociente eleitoral para os candidatos a deputado federal de São Paulo era 303.803 votos. No total, o PRB paulista obteve 2,24 milhões de votos, dos quais 1,5 milhão (68%) foram dados ao deputado Celso Russomanno, o mais votado do Brasil.
O desempenho de Russomanno permitiu que a bancada paulista do partido conquistasse oito vagas na Câmara dos Deputados, já que o quociente eleitoral não foi alcançado por nenhum dos outros sete eleitos – o segundo colocado do partido, Antonio Bulhões, por exemplo, obteve 137 mil votos.
Na hipótese de que a regra atual estivesse em vigor naquela eleição, dos oito eleitos por São Paulo, o PRB perderia dois – os deputados Marcelo Squassoni (eleito com 30.315 votos) e Fausto Pinato (22.097 votos), que não teriam atingido os 10% do quociente eleitoral (o correspondente a 30.380 votos).
ARTE: Nova lei prevê percentual mínimo de quociente eleitoral para candidato a vereador (Foto: Arte/G1)
Estratégia divide partidos
A uma semana da eleição, a questão divide as siglas sobre qual estratégia adotar: alertar o eleitor para priorizar o voto em candidatos e não na legenda ou não fazer alarde a fim de não desestimular os candidatos.

Alguns partidos, como o PSOL, estão incentivando os eleitores a votar diretamente em um candidato e não optar pelo voto na legenda.
O deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ) publicou na última sexta-feira (23) um vídeo no Facebook explicando a nova regra e pedindo aos eleitores para não votar na legenda.
“Em todas as eleições, o PSOL recebe muitos votos de legenda para vereador […]. Contudo, dessa vez, eu quero pedir a você que não faça isso. Escolha um/a candidato (a) a vereador (a) do PSOL e vote o número completo”, escreveu.
O líder do PSOL na Câmara, deputado Ivan Valente (SP), explicou que o objetivo da orientação do partido é justamente ampliar o número de votos em candidatos individualmente. “Estamos pedindo para votar nos vereadores porque temos que alcançar também um novo quociente”, disse.
Crítico a essa mudança na legislação, o deputado Ronaldo Fonseca (PROS-SP), líder da sigla na Câmara, observa que a questão vai no sentido contrário ao que se pretende.
“Em vez de privilegiar as ideias do partido, o eleitor é obrigado a escolher um candidato”, avalia.
Fonseca conta que o PROS preferiu não fazer alarde sobre essa linha de corte para os candidatos a fim de, segundo ele, não desestimular quem tem chance menor de se eleger.
“É uma faca de dois gumes. Se chamarmos atenção para isso, os candidatos menores vão acabar desestimulados porque vão ver que não terão chance. Não queremos desestimulá-los”, diz Fonseca. “Essa regra vai beneficiar partido grande. Só vai ficar peixe grande”, declarou.
O PPS não tem dado muito destaque na campanha para essa alteração na legislação, segundo o deputado Rubens Bueno (PPS-PR), líder da bancada na Câmara.
Ele disse, porém, que pretende procurar a direção do partido para alertar sobre o impacto do voto de legenda sobre as candidaturas dos menos conhecidos.
Sobra de vagas
Como o resultado dos cálculos para se determinar o total de vagas por partido geralmente produz números quebrados, acabam sobrando algumas vagas, distribuídas entre os partidos que asseguraram cadeiras na Câmara Municipal.

Para isso, é feito um novo cálculo, e o partido ou coligação com a maior média preenche a vaga, o que já acontecia em eleições anteriores. A diferença é que, agora, para conseguir ocupar essa vaga remanescente o candidato necessita ter o percentual mínimo de 10% do quociente eleitoral.

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